Como Theo van der Loo fez, na prática, a inclusão de diversidade na Bayer

inclusão de diversidade nas empresas

O apoio da alta direção e seu engajamento é fundamental para que seja bem executada a estratégia de inclusão de diversidade nas empresas.

Ex-presidente da consagrada companhia Bayer, Theo van der Loo sempre se destacou pelo seu forte empenho nesta missão.

Em parceria com equipes de RH e comunicação, van der Loo criou um processo de recrutamento e seleção mais inclusivo.

Isso é essencial para empresas que pretendem se manter atrativas no mercado, uma vez que mais pessoas buscam companhias e marcas com propósito e valores alinhados às suas crenças pessoais.

“Faz bem para qualquer negócio incluir a diversidade, pois ela vai apresentar ideias diversas, opiniões diversas, que irão permitir que se tomem decisões diferentes, muitas vezes mais coerentes”, afirma o executivo.

Durante toda sua trajetória profissional, van der Loo vem incentivando executivos a trabalharem melhor a questão da diversidade e da inclusão, uma postura consciente que foi trabalhada desde sua infância.

Filho de holandeses, seus pais vieram para o Brasil após a guerra, com valores um pouco diferentes do que a média brasileira.

“Minha mãe sempre ajudava as pessoas, independentemente se era rico, pobre, branco, negro. Esse foi o modelo que eu sempre tive na minha educação e, conforme eu fui crescendo, fui evoluindo também esse meu lado”, revela.

Carreira

Van der Loo foi para a Holanda com a família aos 12 anos, fez um MBA nos Estados Unidos e voltou para o Brasil no anos 80. O choque cultural interveio.

Ele se deparou com a favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, tinha se esquecido da existência da miséria, que não via lá fora.

“Sempre me preocupei um pouco com esse lado social e tentei ajudar as pessoas. À medida que fui crescendo na minha carreira, pude ajudar mais pessoas por meio de políticas internas na empresa, dentro do que era possível”, conta.

Em 1988, ele começou a trabalhar na Schering, uma companhia farmacêutica alemã dedicada à saúde da mulher, onde, contraditoriamente, só contava com propagandistas homens.

Havia resistência até o início dos anos 90 e, aos poucos, o índice de mulheres nas empresas foi aumentando, não só na Schering, mas na indústria farmacêutica de forma geral.

A questão étnica era ainda mais delicada. van der Loo percebia que no Brasil havia poucas pessoas negras nos escritórios, mais nas fábricas.

Em 2004, a equipe da Schering identificou uma mulher negra com muito potencial no SAC, que ao passar por um processo de seleção acabou se tornando a primeira mulher negra na força de vendas da empresa.

Em 2006 van der Loo foi transferido para a Espanha, mesmo período em a Schering foi comprada pela Bayer.

Quando retornou no final de 2010, van der Loo assumiu a posição de presidente da companhia, que não era mais a Schering, mas sim a Bayer, uma empresa composta por um time de funcionários com poucos negros.

E é sobre o processo de implantação de diversidade no qual ele se dedicou que vamos falar neste artigo hoje. Fique conosco até o final!

Desafios culturais

Na Bayer, van der Loo começou a se perguntar o que poderia ser feito para mudar a falta de diversidade. Por volta de 2014, a Bayer global começou a desenvolver programas de diversidade exclusivamente para mulheres e LGBTI – cada país lida com questões sociais e legislações diferentes.

Perante essa situação, a empresa começou a desenvolver um processo envolvendo públicos de etnia, PCD e, mais tarde, de novas gerações.

Durante sua direção era máximo o cuidado, desde a preparação de materiais corporativos e campanhas institucionais (que deveriam conter imagens de pessoas brancas e pessoas negras) até a questão da admissão de pessoas negras para ocupar cargos mais altos.

Aos poucos, van der Loo, em conjunto com as equipes de RH e comunicação, foi mobilizando mais e mais pessoas dentro da corporação.

Conversar com os poucos profissionais negros que trabalhavam na Bayer permitiu que ele entendesse de fato o que se passava: pessoas negras sentem que precisam se esforçar muito mais para conseguir uma promoção se comparadas às pessoas brancas. E havia muito interesse delas em externar o que sentiam e o que pensavam.

van der Loo sentia que precisava usar mais sua intuição, afinal, a questão era delicada, que facilmente poderia induzir erros – se tratava de uma pessoa branca que queria entender o que as pessoas negras sentiam.

Então, foi ampliado o debate, incluindo mais pessoas negras e também o RH. Com a parceria do jornalista Maurício Pestana, primeira pessoa negra fora da Bayer com a qual Theo teve contato para falar sobre a causa, o CEO pôde conhecer melhor as questões deles.

Isso lhe deu mais segurança para seguir com a discussão e reforçar a luta.

Nessa mesma fase, foi criado o comitê da diversidade, convidando mulheres, pessoas negras, LGBTI e pessoas com deficiência a manterem o debate, apontando os principais desafios e necessidades.

Com o auxílio da fundação Dom Cabral, a companhia fez um levantamento interno para ter uma ideia de como estava a distribuição da diversidade dentro da própria Bayer.

O resultado foi que 35% era composto por mulheres, 10% pessoas LGBTI, 16% por pessoas afrodescendentes e quase 5% por pessoas com alguma deficiência.

Com os avanços sobre o tema, a empresa decidiu criar grupos de afinidade, ou seja, dentro do grupo de gênero, por exemplo, havia mulheres brancas, negras, LGBTI e com deficiência.

Uma mulher negra poderia participar do grupo de gênero e também de etnia.

Assim, foram preenchendo esses grupos e também fazendo reuniões com diversas assessorias externas discutindo alguns temas mais importantes.

RH engajado na causa

A área de Recursos Humanos (RH) tem papéis fundamentais nessa jornada, e um deles é juntamente com a área de comunicação.

Foram executadas outras iniciativas importantes, como a inclusão de campanhas internas, intranet e TV corporativa.

Essas ações aplicadas não apenas na matriz, em São Paulo, mas também nas fábricas fora da capital e no Rio de Janeiro, além de videoconferências com o time de vendas.

A equipe de comunicação também gravou depoimentos dos colegas LGBTI, que contavam suas experiências de como foi assumir sua sexualidade.

Esses vídeos foram compartilhados dentro da empresa, para que todos os colaboradores pudessem entender como é a vida de uma pessoa LGBTI e toda a problemática familiar em torno deste tema.

Outro papel fundamental é na contratação de pessoas.

Profissionais de RH têm um compromisso importante em se engajar para contratar pessoas diversas. Elas hoje dão uma atenção maior na contratação, procurando agir sempre  contra o viés do inconsciente – o conjunto de estereótipos que mantemos sobre diferentes grupos de pessoas a partir de situações e experiências que vivenciamos ao longo da vida e que, por causa disso, se usa a razão para justificar algo que não é justo e correto.

Isso vale também no caso das promoções; elas têm procurado agir com mais cuidado para garantir que os profissionais possam avançar nesse sentido.

Outro elemento que contribui para contratações mais justas e conscientes são profissionais de Recursos Humanos que também fazem parte da diversidade atuando no departamento, o que favorece a compreensão e o diálogo.

 

O papel do CEO

Empresas multinacionais são mais proativas em suas políticas de inclusão de diversidade que as empresas nacionais.

“Além de ser em sua maioria, multinacionais, seus CEOs geralmente estão mais preocupados em sair na foto do que no filme”, acredita van der Loo.

Ele explica que “sair no filme” é se engajar realmente na luta, conversando com as minorias e participando das discussões, conhecendo suas vidas e entendendo suas dificuldades.

Isso dá muito mais trabalho do que se comprometer apenas de forma superficial, estampado sua imagem em comunicações institucionais.

Para van der Loo, é preciso que os CEOs se comprometam de forma verdadeiramente genuína. Os empregados de uma empresa sabem quando o apoio é real, o que gera mais apoio na luta contra o preconceito.

É interessante perceber que todo esse trabalho de diversidade muitas vezes se mostra complexo, porque, dificilmente alguém não vai concordar com essas iniciativas.

Mas, na prática, quem efetivamente está atuando nesse trabalho?

“Eu acredito que a maior dificuldade que a gente tem hoje é tirar as pessoas da zona de conforto. Parafraseando um amigo, ele costuma dizer que é como a yoga, todo mundo se simpatiza, mas pouca gente pratica. Todos acham uma boa ideia, mas não pratica a inclusão da diversidade no dia a dia. Se fosse algo fácil eu não estaria nem participando dessa entrevista agora”, revela o executivo.

“Para o homem branco que normalmente detém o poder dentro de uma empresa é muito mais conveniente manter como está, muitas vezes de forma inconsciente, porque ele não é afetado. No entanto, ele não sabe o que significa ser mulher, ser negro, ser PCD, e, dessa forma, não vai ter o ponto de vista de outras realidades”, complementa.

A diversidade permite ouvir opinião diversas, o que leva a decisões mais assertivas.

No entanto, van der Loo explica que esse não é o motivo principal da inclusão, mas sim representar verdadeiramente a sociedade como um todo.

“O CEO tem que estar comprometido na causa da diversidade e da inclusão para transmitir essa mensagem e quebrar essa barreira de empresa perfeita, onde há na verdade tanta discriminação. Muitos ainda não consideram o tema importante e não dão a devida prioridade, mas temos que insistir, enfatizar essa necessidade e multiplicar as pessoas que apoiam essa luta, principalmente as que contratam”, orienta van der Loo.

Inclusão de diversidade nas empresas

Foi necessário fazer alguns acertos no processo de inclusão da diversidade e a empresa aprendeu que algumas coisas não funcionam.

“A gente logo percebeu, por exemplo, que não adiantava só o pessoal de RH e comunicação falar de diversidade; os vice-presidentes e os comitês executivos da empresa precisavam estar comprometidos nas discussões”, explica.

Hoje na Bayer cada grupo de afinidade tem um sponsor, que é uma pessoa com um cargo alto na empresa – o head das divisões – que dá apoio especial para cada grupo, o que fez aumentar o compromisso das pessoas em participarem do processo.

“O interessante é que nós temos alguns gestores que nos apoiam bastante e insistem muito em selecionar candidatos da diversidade para as vagas. Alguns até reservam algumas vagas para pessoas da inclusão da diversidade, esperando o tempo necessário até realmente achar algum candidato com as características”, detalha.

Isso diminui o risco que candidatos não deixem de ser escolhidos por um viés inconsciente de discriminação.

O eSocial é uma ferramenta recente também auxilia a empresa a identificar exatamente quantos negros trabalham na companhia e onde é que eles estão – na fábrica, no escritório ou no ponto de vendas – comparando com o censo interno da empresa, eles viram que o índice de pessoas negras trabalhando na empresa aumentou para 21%.

Além disso, o sistema de cotas da empresa mostra que a Bayer tem mais colaboradores negros em grupos de estagiários, o que permite que a gestão atue em duas frentes:

– Encontrar mais candidatos negros;
– Disponibilizar vagas para negros da empresa em cargos maiores.

A meta da companhia é ter de 35 a 40% de negros no grupo de estágio, o que fortalece a possibilidade de que desenvolvam carreira para atuar na empresa ou fora dela.

“Muitos falam que faltam candidatos para cargos específicos, mas uma coisa é não ter candidato, outra coisa é ter mais trabalho para encontrá-los. É preciso que os profissionais de Recursos Humanos se esforcem um pouco mais para achar o candidato e também que influenciem os gestores, decisores da contratação – a serem mais inclusivos, formando assim mais negros no processo de carreira”, acredita.

Atualmente a Bayer também estuda a possibilidade de implementar a dinâmica do processo seletivo às cegas, que muitas empresas estão fazendo.

Nele, os candidatos podem enviar currículos sem o nome, nem o gênero especificado, nem mesmo fazer a menção da faculdade. Isso permite que o RH se baseie apenas na experiência profissional que o candidato possui.

Dessa forma, o profissional recrutador fica sabendo se a pessoa é mulher, homem, branco, negro ou deficiente só em uma etapa mais avançada, o que pode trazer mais candidatos da diversidade.

Exposição na mídia

Através desse trabalho incansável de conscientização, van der Loo ganhou muita repercussão em 2017, por meio de uma publicação feita no LinkedIn, denunciando um caso de racismo em uma seleção de emprego.

“Acabei recebendo mensagens de pessoas através da rede social, elogiando minha atitude, o que tornou a Bayer uma referência de diversidade na causa”, explica.

A repercussão também revelou um lado obscuro.

“Minha publicação no LinkedIn gerou um impacto tão grande que me fez perceber que o Brasil vive em um apartheid velado. Recebi mensagens principalmente de mulheres negras, que não queriam denunciar atos de racismo com medo de perder o emprego e mensagens de pessoas pedindo para que eu não parasse de falar sobre o assunto, porque essa era a primeira vez que tinha uma pessoa branca, do meu nível, se dedicando a essa causa”, conta.

Ele diz que aprendeu que, infelizmente, algumas coisas são mais aceitas quando uma pessoa branca fala, porque quando um negro fala, pode soar como vitimização.

Transformação dentro das empresas

Van der Loo garante que a inclusão da diversidade em uma empresa a transforma totalmente.

À medida que o CEO da Bayer foi participando de mais palestras em outras empresas, ele pôde se reunir com mais pessoas da diversidade e tudo o que foi cultivado na Bayer hoje está dando frutos.

Outros colaboradores estão participando de palestras e debates em torno da diversidade, ampliando o leque de pessoas engajadas e de outras empresas que também compartilham ideias e experiências com a companhia.

A diversidade também permitiu à Bayer unir as divisões da corporação matricial, com departamentos tão distintos e separados entre si, fortalecendo também a motivação de cada colaborador.

Legado e futuro

Após sua saída da Bayer, van der Loo fala que o mais importante é que o sistema criado na empresa seja irreversível.

“O meu sucessor é totalmente favorável às iniciativas de inclusão. Sair da empresa, mas deixar um sistema que se autoalimenta e funciona por si só com o apoio também da cúpula da empresa me deixa muito satisfeito”, comenta.

Sobre os seus planos fora da companhia, o executivo – que atualmente lidera o grupo de diversidade na câmara alemã – diz que não pode parar de se dedicar a inclusão da diversidade.

“Estou sendo chamado para dar palestras e as faço com prazer. Precisamos mais que palestrar, permear a cabeça das pessoas, tocar mentes e corações. Muitas vezes eu peço contribuições financeiras que são encaminhadas às ONGs que se dedicam à inclusão da diversidade. Estou me organizando e pensando como evoluir mais nesse aspecto”, conclui.

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